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Vamos à Batalha de Salgadela!

Portugal tinha-se libertado do domínio espanhol mas o inimigo ainda tinha esperanças de retomar o nosso território.

A população das fronteiras ainda temia as investidas do país vizinho e na memória estavam frescas as lembranças do último assalto que tinha sido feito à aldeia incendiando as suas casas e saqueando tudo à sua passagem.

Nessa noite de julho os rumores invadiam o território e a população de Mata de Lobos temia pela sua vida fugindo para as Arribas do rio Águeda com tudo o que puderam transportar. Ao longe as fogueiras do acampamento do inimigo davam vida aos rumores e o ataque às muralhas de Castelo Rodrigo estava iminente, lançando o pânico com berros numa celebração de uma vitória que tomavam como certa.

Do lado de dentro das muralhas o medo era palpável e centena e meia os homens que compunham a guarnição militar portuguesa.

Uma noite que deu lugar a um dia que acordou com o ruído do ataque dos espanhóis que aterraram as populações vizinhas. No alto das arribas, onde se escondiam os Matenses, apenas o silêncio do medo dos que lá estavam.

Os bravos guerreiros portugueses, com poucas munições, deixaram as suas almas nas mãos do divino. Santa Maria de Aguiar, Padroeira do Concelho, cujo convento se via lá em baixo, a caminho do Casarão da Torre era o destino das preces.

Restava, apenas, nestas horas que os separavam da morte certa, fazerem o possível para parecerem mais do que o que realmente eram, e rezar.

No alto da muralha os soldados andavam de um lado para o outro na esperança de criar uma ilusão de dimensão ao inimigo que não cessava de atirar contra eles com uma fúria que apenas aumentava.

No chão, em frente ao castelo, uma mulher recolhia as balas caídas, numa aparente indiferença ao medo causado pela investida espanhola, e as recolhia num açafate enviando o mesmo aos soldados portugueses quando cheio.

Enfurecidos os espanhóis com tamanha desfaçatez por parte de tão incauta senhora, fizeram dela o alvo da investida.

Mas as balas não atingiam a mulher que, calmamente, continuava a apanhar as caídas e as entregava aos soldados que estavam do outro lado da muralha.

Os portugueses olhavam e davam brados de alegria perante este milagre, entusiasmando a incansável Senhora.

As balas reforçaram o poder dos nossos soldados que ripostaram com força e coragem, dificultando a investida espanhola e demonstrando que não seria fácil vencer os portugueses mesmo estando em número superior.

O milagre deu-se e a Senhora, reza a lenda, ergueu-se no ar e subiu aos céus rodeada por uma auréola brilhante.

Um grito uníssono ecoou nas muralhas, a Nossa Senhora de Aguiar tinha ouvido as preces de todos os portugueses e acudiu as suas almas e as da restante nação.

Os soldados resistiram ao ataque espanhol até chegada do reforço das tropas de Pedro Jacques de Magalhães e os poucos espanhóis que sobreviveram às mãos de soldados, populares e lavradores foram enviados para Espanha para não mais voltar.

Se houve milagre ou não, a história não saberá provar, fica a fé dos homens que ainda hoje veneram a sua Santa Padroeira, que naquele fatídico dia de 7 de julho de 1664 salvou as almas portuguesas que lutavam por manter o nome da nação.

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Hoje não esquecemos esta data e em Figueira de Castelo Rodrigo relembra-se a batalha e o milagre com a Recriação Histórica “Salgadela a Batalha”, numa representação seiscentista que representa e apresenta às gerações de hoje, o feito mais marcante da história do Concelho.

A aldeia de Castelo Rodrigo será o local da Batalha nos dias 20 e 21 de agosto que nos levará numa viagem pelo passado da região.

 

 

Pelos caminhos entre Castelos

Tenho a cabeça a entrar em modo outono e mal posso esperar que chegue esta estação.

Não me julguem mal, tal como a maioria dos portugueses, eu até que gosto da primavera, posso ser, sim, condenada por não gostar do verão mas, como já diz a sabedoria popular, “gostos não se discutem”.

Porque é que gosto do outono? Porque a paisagem se enche de cores maravilhosas! As diferentes tonalidades ocres da paisagem pintam tudo demonstrando como a natureza é caprichosa. Adoro aqueles dias em que se começa a sentir frio e a sensação de conforto que um casaco de malha proporciona é maravilhosa. E a comida? Os frutos do outono são uma ode à gastronomia!

Mas, confesso, o que mais me impressiona não é o voltar a sentir o cheiro e o calor da lareira. O que mais me deixa extasiada são as mil cores do outono. As folhas e os seus tons quentes em contradição com o vento que carrega ares mais frescos. O bailado das aves. As tonalidades do entardecer. A palidez da lua da manhã e as primeiras névoas. É o preparar da natureza para o longo descanso que a espera nos meses gelados do inverno.

Esta é, a par da primavera, uma das melhores alturas para se passear pela Serra. Caminhadas mais temperadas que nos permitem contemplar a transformação que se desenrola aos nossos olhos. N

a primavera temos a oportunidade de assistir ao acordar da montanha. Ao chilrear dos pássaros cheios de energia. O desabrochar das flores. Os tons frescos e vivos que anunciam o tempo mais vivaço!

Por outro lado, o outono, dá-nos a oportunidade de apreciar a preparação da montanha para o descanso, numa beleza madura, tranquila e serena.

Sugiro, para o próximo mês de outubro, uma caminhada entre Castelos Medievais, os de Trancoso e de Linhares.

Duas localidades cheias de história e paisagens deslumbrantes. Seguimos esta etapa da Grande Rota, com cerca de 43 km, num tempo estimado de 10h15, mas não se assustem, são muitas horas mas o percurso é de dificuldade baixa.

Saímos de Trancoso pelo lado sul entrando em terra batida e descendo em direção a Miguel Choco onde seguimos por Vendo do Cepo, entrando no vale da ribeira de Muxagata.

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Os planaltos junto de Trancoso estão cheios de elevações que, ora são rochosas, ora estão cobertas de pinhal, onde podemos apreciar os campos fechados por sebes arbóreas, constituídas, essencialmente, por carvalho negral.

O Vale da Muxagata é rico em paisagens agrícolas, sendo ladeado por amieiros.

Dos pinhais e giestais sobranceiros podemos ouvir o piar de gralhas-pretas e do peto-verde.

Ao longo dos caminhos e dos lameiros surgem sebes vivas na forma de pilriteiro ou até trovisco-fêmea.

Ao pé da ribeiro podemos encontrar pintarroxos, pintassilgos, cartaxos, rolas, melros pretos e outras espécies que nos encherão o passeio de música.

Ao longo deste vale passamos pela Aldeia Nova e por Muxagata, acompanhando a ribeira até a mesma desaguar no rio Mondego.

No cimo do vale, quando já nos aproximamos de ambientes mais serranos, podemos ter a sorte de observar a águia-de-asa-redonda ou o picanço real. Aqui cruzamos a linha do comboio e a autoestrada, pela passagem inferior seguindo o rio Mondego para jusante atravessando-o num açude para de seguida subirmos a encosta que nos levará até a EN16. Cruzando esta estrada seguimos em direção a sul, cruzando as localidades de Mesquitela, Carrapichana e Figueiró da Serra em direção a Linhares da Beira, cujo Castelo já nos acompanha, ao longe, no alto da sua colina, sobranceiro e majestoso, pela calçada Romana.

Nesta região encontramos alguns dos campos agrícolas mais antigos da Serra da Estrela.

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Chegados a Linhares sugiro que subam ao Castelo. Descansem, respirem fundo e sintam-se parte dessa natureza sem fim que se estende aos vossos pés. É uma tela viva e em constante mutação, de cores quentes que nos fazem sentir acolhidos. Se começarmos a nossa aventura pela manhã cedo, conseguimos chegar a este local a tempo de ver o sol pôr-se. Aprecie o ocaso que no outono se revela mais esplendoroso por estas bandas!

 

Fontes: Aldeias Históricas de Portugal

 

 

 

Há férias para além da praia

Agosto é, por tradição, o mês das férias dos portugueses e, por tradição ou por falta de conhecimento de alternativas, a romaria nesta altura segue em direção ao pôr do sol das praias, numa busca desenfreada por um lugar no areal cheio de gente, mesmo aqueles que por esses lados vivem durante todo o ano.

Não me interpretem mal, eu gosto da praia.

Nasci no litoral e sou uma daquelas pessoas que fazem parte da tribo dos que gostam da água fria das praias do norte, vejam só! É verdade sou super fã, mas isso são histórias para outros dias.

Certo ano, por esta altura, foi decidido cá por casa que as férias não teriam água salgada. O choque! Seguido da esperança de uma viagem além fronteiras rumo a uma cidade cosmopolita dessa Europa fora, composto por uma chamada à realidade financeira dos meus parcos recursos monetários, típicos de uma jovem na casa dos 25 anos acabada de entrar no mercado do trabalho.

“Vais ver que existem férias sem mar”, rematou o meu namorado, beirão de gema.

O roteiro estava planeado por quem conhece estas terras e por quem tem orgulho em exibi-las como se fossem um prémio obtido pelo esforço de uma qualquer demanda.

“Começamos amanhã pela manhã”.

E assim foi.

Mochila com as provisões necessárias para o dia e que consistiam em sandes, bolachas e água. Máquina fotográfica em riste e a certeza de que não haveria mergulhos nem toalha estendida ao sol.

Seguimos rumo a norte do distrito até Vila Nova de Foz Côa, ainda pela estrada nacional, apreciei cada nuance da paisagem. Os olivais e os campos acastanhados pelo calor.

Junto ao Côa a fronteira do distrito, passamos pelo Pocinho e voltámos para trás. Saímos da estrada e fomos conhecer Marialva. Foi aqui que comecei a perceber o que tem de mágico a região. As suas aldeias e os seus castelos. As suas histórias e a simpatia das gentes que nos saúdam ao passar. A humildade dos seus passos e dos seus sorrisos.

Passamos a tarde por esta parte do distrito da Guarda.

“Amanhã vou levar-te a Pinhel, Almeida e a Castelo Mendo. Ainda vais conhecer o Sabugal, Sortelha, Belmonte, terra de Cabral e Judeus e Manteigas! Até pode ser que te leve a dar um mergulho!”.

E assim foi. Um dia inteiro para passear por terras do Sabugal e o seu castelo, embrenhar-me nas ruas de Sortelha. Parámos várias vezes pelo caminho apreciando as aves e as raposas que pulavam pelos campos.

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Tive direito ao mergulho na praia de Valhelhas onde acampámos pela noite.

No dia seguinte fui conhecer o Vale Glaciar do Zêzere, cujas paisagens conhecia apenas da época de Inverno e que me deslumbraram no verão.Aqui a luz é diferente e transforma a paisagem num quadro quase etéreo. O calor é intenso e as noites frescas e revigorantes. Conheci o Poço do Inferno que de infernal nada tem e o Covão de Ametade, lindo de morrer.

Os dias passaram e conheci a zona de Seia e Gouveia, a aldeia de Linhares e os corajosos que aqui ganham asas de parapente, afortunados que por momentos têm privilégios de pássaro.

Conheci pequenos tesouros onde se pode mergulhar como o Vale da Castanheira, com água gelada como eu gosto!

“Vês é tão gelada como as praias do norte”!

Por terras de Folgosinho conheci a Senhora de Assedasse e a paisagem deslumbrante que durante a noite dá lugar a um mar de estrelas sem fim!

Em Vale do Rossim fiquei surpreendida pelo azul da água, espelho do céu que ali se reflete com vaidade.

E mesmo próximo da Guarda há lagoas secretas!

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E assim se passaram duas semanas com fugas e escapadas por alguns tascos e restaurantes bem em conta, onde pude “degustar” a Serra. Acho que foram nestas férias que o meu namorado me fez apaixonar por estas terras e rendeu a minhota que há em mim aos sabores, perfumes e paisagens da Serra da Estrela.

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Hoje é meu marido, gosto de pensar que o plano dele foi sempre esse: garantir que me apaixonava por esta terra e nunca mais quisesse daqui sair, tornando-me sua mulher. Conseguiu.

Há mais que praias neste Portugal para visitar e onde podemos passar as nossas férias.

Há terras e gentes para conhecer.

Comida para provar e paisagens para descobrir.

Há todo um país que nos convida a fugir das praias salgadas e conhecer as suas raízes.

Atrevam-se a descobrir esse mundo, e ainda por cima é para toda a família!

Não fui ao estrangeiro… quer dizer…o meu marido, então namorado, fez questão de me levar até Vilar Formoso e ver a placa que diz Espanha. “Pronto já podes dizer que foste ao estrangeiro nestas férias!” por isso, tecnicamente, acabei por ir…

 

Tânia Fernandes

 

Pelos olhos de Linhares da Beira

Majestoso no alto da sua colina, protege os vales aos seus pés.

O Mondego é seu aliado e mesmo que por estes lados os mouros já não façam tremer os seus súbditos, no seu trono há maravilhas que ninguém pode conquistar, apenas desfrutar, apreciar e preservar. Linhares da Beira é especial.

Aqui do alto o pôr do sol é um espetáculo que não se pode perder, e nas manhãs em que a neblina serpenteia lá em baixo, escondendo as povoações e transformando a paisagem num vasto lago intocável, neste trono podemos ser espetadores privilegiados.

Há quem venha até estas terras porque aqui podemos voar como os pássaros. Bem do alto da colina que se ergue atrás de nós. Saltado como águias de asas abertas, para um precipício etéreo que se estende até onde os olhos alcançam. Antes um campo de linho, hoje a Capital do Parapente.

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A história por estas terras é parte integrante da alma das suas gentes porque aqui o tempo parou.

As ruas de pedra contam histórias ao ritmo do nosso caminhar. Quando passeamos por elas, estreitas e misteriosas, sabemos que no final delas o vamos encontrar sumptuoso, ainda majestoso, o castelo de Linhares da Beira.

Linhares da Beira poderia ser como as outras Aldeias Históricas que existem na região da Serra da Estrela. Podia, mas não é. Linhares é misteriosa, queda no seu palrar, obriga-nos a procurar recantos, desvia-nos o olhar enquanto caminhamos, e mesmo que as casas nos pareçam iguais às outras, de tantas aldeias por esta serra, aqui, a cor é diferente. O cheiro e o cantar da água aguça-nos os sentidos e, nos dias gélidos do Inverno rigoroso da Serra, quase podemos ouvir o cantar de donzelas, batalhas milenares e reuniões de nobres senhores que viviam por esta terra que deve o seu nome ao Linho que aqui se cultivava.

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Terra de grandes batalhas que forjaram a nação, defensor dos seus e dos vizinhos.

Na Primavera Linhares da Beira convida pelas suas paisagens. Aqui é possível provar algumas iguarias beirãs e, aqui nesta pequena aldeia, podemos encontrar um dos melhores restaurantes da região, o Cova da Loba onde os sabores tradicionais são apresentados numa ode moderna à gastronomia.

Em Linhares ande a pé. Deixe-se perder, porque a certeza é que se encontrará, seja nas pedras da calçada, seja na água, seja no granito omnipresente, ou no Castelo assente no rochedo, ou na paisagem que se vai alongar a seus pés. Percebe-se porque foi escolhido este pedaço de mundo por tantos povos e cobiçado por tantos outros, aqui a nação estende-se até onde os olhos não conseguem alcançar mais!

 

Fotografia: Aldeias Históricas, Clube Vertical