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A Guarda e os seus Efes

 

A Guarda é daquelas cidades que primeiro se estranha e depois se entranha, e sem sabermos porquê, não se arranca mais de nós. Cola-se na pele, embrenha-se na alma, tal como o frio que por aqui é visitante honorário.

 

Quem aqui vive já os conhece. Sabe-os de cor e salteado e di-los com o peito cheio de orgulho. Para todos o significado é conhecido, sabido e sentido.

A Guarda é a cidade mais alta do país. Cidade de D. Sancho I que se perdeu de amores pela sua Ribeirinha. Cidade com o ar mais puro de Portugal, onde o frio se estranha e entranha. Onde o clima agreste nos brinda com paisagens de belezas geladas no inverno e de verdes luxuriantes no verão.

A Guarda é conhecida pelo frio, pela comida, pelo ar e pelos seus 5 Fs.

Quando para cá vim, caloira e desconhecedora das virtudes e desvirtudes da Guarda, fui, de imediato, brindada com os 5 Fs da cidade, aprendendo num instante a cantarolá-los e a abraçá-los como se fossem meus, e mal sabia eu na altura, que o seriam por muito tempo.

São 5. Verdadeiros.

 

Forte

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O “F” de Forte foi atribuído devido ao seu passado histórico.

Com a sua torre do castelo, as muralhas e a posição geográfica que, aqui do alto, na Guarda, demonstram a força que a cidade tinha na defesa da nação.

Hoje, já não é uma das sentinelas que defendem a fronteira de Portugal, mas continua Forte. Forte em História e histórias para contar. Forte em afetos e tradições. Forte na resiliência que tem em contornar os desafios que a modernidade apresenta e forte em manter-se viva.

 

Farta

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A região da Guarda é conhecida pela riqueza que brota no vale do Mondego, local privilegiado para culturas que dão origem a sabores únicos e inesquecíveis.

A Gastronomia continua a ter um papel preponderante na identidade destas gentes e quem por aqui passa leva na alma e na boca o paladar de iguarias que só aqui, neste pedaço de mundo, se consegue encontrar. Não falo apenas da charcutaria ou dos queijos. Falo dos pratos de borrego e cabrito que de destacam pelo sabor genuíno apenas obtido pelos pastos verdejantes e ricos onde os animais crescem. Falo do sabor dos legumes que, por aqui, crescem no seu tempo. Falo do sabor dos frutos da época, dos cogumelos, das castanhas, das maçãs. Falo da carne da vaca jarmelista. Do leite da bordaleira. Únicos. Inigualáveis!

 

Fria

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A Guarda é fria. Gelada.

A cidade mais alta do país, com o seu topo a alcançar os 1056 metros de altitude em relação ao mar. No Inverno o vento rasga a pele mas aquece a alma. É fresco. Puro. E quem por aqui vive afirma ser o melhor frio que existe, e eu atesto a afirmação!

Por cá diz-se que só existem duas estações, a do Inverno e a dos Comboios. De facto, na Guarda, o Inverno é longo, escuro e frio. Com nevoeiro. Parece um cenário que nos leva a querer desconsiderar uma visita nos meses mais frios. Pois bem, digo-vos, o Inverno é a melhor altura para visitar a Guarda! Correm o sério risco de se apaixonarem por árvores cobertas de gelo, em molduras de cristal cintilante!

Correm o risco de acordar pela manhã, abrir a janela, e descobrirem que flutuamos acima das nuvens, num mar de brancura que se estende aos nossos pés. Ao caminhar pela serra o cantar da água que corre desenfreada por correntes em todos os cantos é a banda sonora perfeita para assistir ao suave pôr do sol que abraça a paisagem, que por aqui, parece não ter fim. E podem ter a surpresa de ir caminhando na rua e serem beijados por flocos de neve que caem quase sem aviso! E chegar a casa no final do dia e ser recebidos por uma lareira quente, que para aqueles que como eu possuem algum tipo de ADN de pinguim, o fim perfeito de mais uma jornada!

 

 

Fiel

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Reza a história que Álvaro Gil Cabral, Alcaide-Mor do Castelo da Guarda e trisavô de Pedro Álvares Cabral, recusou entregar as chaves da cidade ao Rei de Castela durante a crise de 1383-85.

Teve ainda fôlego para combater na batalha de Aljubarrota e tomar assento nas Cortes de 1385 onde elegeu o Mestre de Avis (D. João I) como Rei.

Os Beirões são gente fiel. Fiel aos seus princípios. Às suas tradições. São gente tímida de aparência distante, mas que recebem como ninguém. Abrem as portas das suas casas e das suas dispensas e oferecem manjares únicos a quem lhes cair na simpatia. É gente recatada mas de valores. Alma portuguesa e trabalhadora. Gosto disso.

Ainda em relação a este F, é sintomática a gárgula voltada em direção a nascente (ao encontro de Espanha): um traseiro, em claro tom de desafio e desprezo. Quem para cá vem estudar enfrenta a divertida Praxe de encontrar o “rabo” da Sé”, algo que os turistas também são desafiados a encontrar. A Gárgula Fiel”!

 

Formosa

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Aqui a natureza foi generosa, com a montanha a oferecer paisagens deslumbrantes, vertiginosas e verdejantes, são vales e falésias pintadas por artistas que a natureza enviou.

Seja em que altura do ano for, aqui a paisagem conta as estações do ano com cores e cheiros, danças e músicas impossíveis de encontrar noutro local. Seja no amanhecer fresco de um dia de inverno ou no entardecer tórrido de um dia de verão, a paisagem muda conforme a luz das horas, a cor dos dias.

A Guarda é, numa primeira impressão, escura, com o cinza das pedras das casas no seu centro histórico a darem uma sensação fria, mas basta caminhar mais um pouco e percebemos que o cinza brilha, as ruas contam histórias e as pedras guardam segredos por descobrir.

O céu parece mais perto daqui do alto, e quando saímos do aglomerado de casas encontramos o mundo aos nossos pés, seja em montanhas seja num céu que se estende sem fim.

O Douro ao fundo, Espanha aqui tão perto e as terras do Sabugal ali ao alcance das nossas mãos.

Na sala de visitas da cidade encontramos, imponente e majestosa, a Sé Catedral, atrás a Torre de Menagem, e à sua volta, ruas e ruelas que embocam em pequenos largos, ou nos levam a portas que nos convidam a entrar na cidade.

Júlio Ribeiro cantou a Guarda, vindo a nascer das suas quadras os 5 Fs que por aqui se tornaram célebres: Feia, Farta, Fria, Fidalga, Feiticeira, cinco Fs que o poeta deixou gravadas por baixo das armas da cidade, que se foram alterando ao lingo dos tempos, adaptando-se a uma realidade muito daqui.

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A Guarda é daquelas cidades que primeiro se estranha e depois se entranha, e sem sabermos porquê, não se arranca mais de nós. Cola-se na pele, embrenha-se na alma, tal como o frio que por aqui é visitante honorário.

Aos 5 Fs outros se juntaram, alguns por parte dos estudantes do Politécnico, o F**, pela distância das famílias e pela exigência do ensino superior, ou o Fabulosa e Fascinante, pelos anos felizes e pelas conquistas que aqui se fazem. Eu junto-lhe o F de Feliz, caso contrário, não continuaria por cá!

Tânia Fernandes

Fotografia: HeartBeat

 

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Quantos Castelos Castelo Branco tem?

Marcas que o passado trouxe até ao presente, símbolos de uma dicotomia desconcertante:

tanto nos fascinam pela sua majestade e imponência, simbologia e importância nas fundações da nação e da nacionalidade, como guardam, marcados nas suas pedras, pecados insondáveis de batalhas perdidas e ganhas, de almas que ali viram as suas vidas chegarem ao fim, de traições, medos e anseios.

São mais que pedras, monumentos ou simples locais, são guardiões de memórias, cofres de segredos e a todos fascinam, sejamos adultos curiosos, ou crianças cuja imaginação corre desenfreada quando os visitam.

São castelos. Portugal tem muitos. Na HeartBeat somos fãs de castelos, das suas histórias, da sua beleza. Já aqui falamos dos muitos que existem no distrito da Guarda e hoje exploramos os que ainda resistem no Distrito de Castelo Branco.

São 10 os que ainda podem ser visitados, apreciados e, acima de tudo, valorizados.

 

Castelo de Castelo Branco

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Lá do alto vigia a região com majestade. Uma fortaleza de 1220 que defendia a linha do Tejo, a par do Castelo de Almourol, Monsanto, o Castelo de Pombal, Tomar e o Castelo do Zêzere.

Foram muitas as lutas que travou sendo várias vezes danificado pelos ataques castelhanos e até nas invasões francesas, destruindo o sistema defensivo de Castelo Branco. Depois da visita dos franceses de Napoleão a população utilizou as suas pedras para a construção de habitações.

A natureza também ajudou a que a sua destruição fosse agravada, com os sucessivos desabamentos de terras causados por inundações a deixarem marcas profundas neste Castelo.

Foram várias as obras de restauração, controversas já que muitos dizem que as mesmas alteraram as características do monumento. Restam alguns troços de muralha, a chamada Porta dos Pelames e a Torre do Relógio. Originalmente este seria um Castelo de planta pentagonal, com cinco torres. A

Torre de Menagem ou dos Templários encontra-se bastante danificada.

 

Castelo de Monsanto

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Claro que a Aldeia mais típica de Portugal tinha de ter um Castelo.

Lá no seu topo granítico, com o rio Pônsul à sua direita, este Castelo complementa aquilo que a Aldeia tem para oferecer e representa.

É um Castelo Medieval, construído sob a orientação do Mestre da Ordem D. Gualdim Pais, sendo ampliado e restaurado por ordens de D. Dinis um século depois, e mais uma vez intervencionado, uns séculos mais tarde, no reinado de D. Manuel I, onde os muros foram reforçados por cinco torres, a mais alta, ao centro, a de menagem.

Infelizmente, dessa estrutura, poucos elementos resistiram ao tempo chegando aos nossos dias, fruto das diversas batalhas que travou, e remodelações, como a que ocorreu no inicio do século XIX, com a Guerra Peninsular, na qual demoliram as cinco torres, construíram três novas baterias e a adaptação da igreja do castelo para paiol, que mais tarde veio a explodir.

O Castelo e Muralhas estão classificados como Monumento Nacional e está ligado a várias lendas. Vale a pena ser visitado!

 

Castelo de Penha Garcia

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Este é mais um dos Castelos cuja origem se admite estar ligada aos Templários, havendo quem atribua a sua edificação ao Rei Povoador, D. Sancho I, passando depois para as mãos dos Templários. Situa-se na freguesia de Penha Garcia, numa posição dominante na serra do Ramiro, sobranceiro ao vale do Rio Pônsul.

A sua destruição o foi acelerada pelos caçadores de tesouros, restando apenas alguns troços de muralhas. Mas nem tudo se perdeu. Em bom estado encontramos um canhão antecarga, de alma lisa na povoação.

Ligada a este Castelo temos uma lenda que conta que D. Garcia, alcaide do Castelo, numa noite de tormenta raptou a bela D. Branca, filha do poderoso governador de Monsanto, que o apanhou e condenou à morte.

D. Branca, piedosa, rogou ao seu pai que reverte-se a sentença. E assim foi. D. Garcia não foi morto, mas ficou sem o braço esquerdo pela sua ousadia.

De acordo com os locais, a figura lendária do decepado continua a vigiar, do alto das torres, o morro sobranceiro de Monsanto, vagueando pelas torres do Castelo.

 

Castelo da Sertã

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Vamos até ao misterioso Castelo da Sertã. Conta a lenda que a sua origem se deve ao um exilado militar romano de nome Sertório, que se aliou aos lusitanos, tendo sido, mais tarde assassinado à traição durante um banquete.

O nome da terra tem origem numa outra história que conta que, durante uma batalha contra tropas romanas, aquando da morte do chefe das tropas do castelo, a sua esposa Celinda, tomou as rédeas à situação e liderou a defesa, lançando azeite a ferver sobre os romanos com uma grande frigideira que usava para fritar ovos no dia a dia (sertage), ganhando tempo para que chegassem reforços, obrigando os romanos a recuarem.

É daqui, desta frigideira que nasce o nome Certã, posteriormente, Sertã. Lenda perpetuada no brasão de armas da vila. Apesar da lenda não há provas que corroborem a sua edificação no período romano, havendo vestígios que remontam ao séc. X.

Trata-se de mais um Castelo que passou pelas mãos dos Templários. O abandono deste Castelo no século XVII levou à sua completa ruína e o que resta dele ainda não está classificado como Monumento Nacional.

Aguardemos a sua classificação.

 

Castelo de Belmonte

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Este é o ex-libris da vila de Belmonte.

A sua mais preciosa jóia. Do alto da vila vigia a região e contempla a Serra da Estrela. D. Sancho I terá sido quem mandou edificar este Castelo, tendo sido melhorado a mando de D. Dinis, tendo sido acrescentada a Torre de Menagem.

Ao longo dos séculos foi passando de “mão em mão”, tendo sido a sua defesa modernizada aquando da Guerra da Restauração, com a construção de alguns baluartes.

No inicio do século XX foi usado como prisão e desde que foi classificado como Monumento Nacional tendo sido, desde então, diversas vezes intervencionado para restauro, sendo, hoje em dia, utilizado para atividades culturais. O Castelo tem a fachada principal orientada para sul, com uma porta encimado pelas armas dos Cabral, cuja memória está também presenta nas ruínas do antigo Paço onde residiram.

 

Castelo de Penamacor

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Também conhecido por Fortaleza de Penamacor, é um Castelo templário e ergue-se num cabeço rochoso entre a ribeira de Ceife e a ribeira das Taliscas.

Apesar da ocupação romana na zona, este castelo deverá ter asido erigido por volta de 1210. Como o povo crescia, D. Dinis terá mandado construir uma segunda cintura de muralhas e a Torre de Menagem. Sob o reinado de D. Fernando foi iniciada uma barbacã para complemento da defesa do Castelo.

Mais tarde, devido à sua localização estratégica, o castelo foi reforçado.

Entretanto a Torre de Menagem que servia de paiol, explodiu, mas o verdadeiro declínio da edificação acontece com a delapidação das muralhas para construção de habitações. Só em 1940 é que as mentes despertam para a necessidade de preservação do castelo.

Restam a Torre de Menagem, uma porta de entrada para a antiga vila e parte dos antigos baluartes seiscentistas.

 

Castelo de Idanha-a-Velha

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A Torre dos Templários. Conjunto de defesas da antiga vila que se constituía, à época medieval, por uma torre e pela antiga cerca da povoação.

Não há muito que dizer acerca desta Torre.

Já a sua povoação, uma das mais antigas do país, cujo conjunto arqueológico e arquitectónico está classificado como Monumento Nacional, considerada uma aldeia-museu, com um dos mais ricos espólios do país.

 

Castelo de Idanha-a-Nova

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Deste Castelo restam ruínas e histórias.

Nascido pelas mãos dos templários, a estrutura obedece às mesmas linhas arquitectónicas características dos templários, nos Castelos de Almourol, Monsanto, Pombal, Tomar e Zêzere.

Hoje em dia as suas ruínas são uma das principais atrações municipais.

 

Castelo de Castelo Novo

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Na vertente leste da serra da Gardunha, na aldeia histórica de Castelo Novo, no Fundão, encontramos o seu castelo, cuja existência remonta ao século XIII, e com ligações aos templários.

D.Dinis manda reforçar as suas defesas, hipótese fundamentada nos vestígios de adarves e ameias dionisinas num dos troços da muralha.

O terramoto de 1755 foi cruel também com este castelo, tendo sido muito danificado. Sofreu algumas obras de restauração em 1938, mas nunca se viu ser classificado nem em vias disso.

Ao abrigo da Arqueonova, no âmbito do Programa Aldeias Históricas de Portugal, foram descobertos centenas de vestígios da sua ocupação medieval, como moedas do tempo de D. Sancho I, peças em ferro, cobre e cerâmica que podem ser vistas no Núcleo Museológico de Castelo Novo.

Está 650 metros acima do mar e é um exemplar da arquitetura militar no estilo gótico e manuelino, com planta irregular orgânica. Há ainda duas portas, a leste e a oeste. No troço oeste encontramos adarves, ameias e merlões em bom estado de conservação. Na Praça de Armas erguem-se as torres sineira, com cornijas e quatro gárgulas nos ângulos, com cobertura em falsa abóbada, e de menagem.

 

Castelo de Rodão

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Também referido como Castelo do Rei Wamba, constitui-se numa torre-atalaia, erguida numa escarpa sobranceira ao rio Tejo, sobre as chamadas Portas de Ródão, proporcionando uma vista maravilhosa aos seus visitantes.

Apesar de ser conhecido como o Castelo do Rei Wamba, último grande rei dos Visigodos, há quem defenda que a sua estrutura possa remontar à Invasão muçulmana e deverá ter sido mandada construir pelos templários.

Portugal é um país riquíssimo em história, com monumentos maravilhosos. Saia dos grandes centros e venha conhecer os castelos que se espalham um pouco por todo o país. A região interior centro tem um património histórico que merece e tem de ser visitado!

 

Fontes: wikkipedia, Aldeias Históricas de Portugal, Guia da cidade

Fotografias: Aldeias Históricas de Portugal, Wikkipedia, Guia da cidade, Adrião

 

Mais Castelos:

https://heartbeat.pt/cinco-castelos-beiras/

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O Padre libertino de Trancoso

Sabemos que estas são terras de histórias contadas de voz em voz, por tantas vozes que já não se sabe se algumas delas são verdade ou mito, aliás, a linha entre essas duas razões é ténue o que as torna, na minha opinião, ainda mais interessantes. A que vos vou contar agora fez-me rir deixando-me, igualmente apreensivo quanto ao resultado da mesma sendo, provavelmente, das mais hilariantes e inacreditáveis que se conta por estas terras. Aconteceu em Trancoso e envolveu um padre!

Conta a história que, ali para os lados de Trancoso, o pecado e a santidade andavam de mãos dadas numa altura em que a nação forjava a sua história e as pessoas andavam em carroças.

Trancoso era um centro importante por estas bandas, local onde se fazia a Feira Franca que por si só atraia muita gente à região. No entanto, consta que estas terras, apesar dos visitantes, não era muito apetecida pelos povos e, por isso, pouco habitada.

Sabemos que, antigamente, o Clero e seus representantes, eram lei, e com a lei ninguém se mete, muito menos com a de Deus. Nem sequer as pessoas se atreviam a questionar, não fosse um raio cair-lhes na cabeça, ou a mão do bispo.

Por cá, um dos representantes da Santa Madre Igreja era um homem de seu nome Francisco Costa, Padre Francisco Costa, Abade de Trancoso.Um homem da igreja que podia ter sido como qualquer outro padre, doutrinando a fé e encaminhando o seu rebanho pelos desígnios do Senhor.Pois consta que este Padre Francisco Costa gostava muito de doutrinar, mas não a palavra do Senhor, e o seu trabalho árduo não era orientado para o rebanho, bem, pelo menos não para todo o rebanho já que, ao que parece, os homens escaparam à libido deste homem que conseguiu uma prol de 275 filhos (outros dizem 299 filhos), de 54 mulheres!

E é que não havia “rabo de saia” que escapasse às suas “orações”, incluindo irmãs, uma tia e a própria mãe.

Um escândalo tal que, para além da excomunhão este homem mereceria arder no recôndito dos infernos para gáudio do Belzebu em pessoa, ou em espírito.

Aos 62 anos, o prior de Trancoso, vê os seus atos travados e julgados, tendo sido condenado a ser degredado (e esta parte da história é real já que os documentos podem ser encontrados na Torre do Tombo) de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas nos rabos dos cavalos, esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes distritos, numa morte que deveria ter servido de exemplo tamanha fora a sua ofensa a deus e aos homens.

Acusado de ter dormido com vinte e nove afilhadas e tendo delas noventa e sete filhas e trinta e sete filhos, de cinco irmãs teve dezoito filhas, de nove comadres teve trinta e oito filhos e dezoito filhas, de sete amas teve vinte e nove filhos e cinco filhas, de duas escravas teve vinte e um filhos e sete filhas.

Dormiu com uma tia, Ana da Cunha, de quem teve três filhas, da própria mãe teve dois filhos.

Um total de duzentos e setenta e cinco, sendo cento e quarenta e oito do sexo feminino e cento e vinte e sete do sexo masculino.

Esta é uma história capaz de fazer corar as pedras da calçada.

Um escândalo para a época, ou para qualquer época diga-se. Seria de supor que perante tamanha desfaçatez, vergonha e libertinagem, a sentença fosse aplicada o quanto antes.

Pois não foi.

Estávamos nos finais do século XV, numa terra nos recônditos da nação governada por El Rei D. João II, o “Príncipe Perfeito”, cognome atribuído pela forma como exerceu o poder, e digamos que para Francisco Costa, este Rei caiu-lhe na perfeição já que pelas mãos dele viu a sua sentença ser anulada.

E aqui pensamos: “ora o Rei era chamado de Príncipe Perfeito pela forma como governava, foi piedoso e não quis que o homem morresse, numa espécie de pensamento modernista abolidor de mortes por tortura e em asta pública”, pois não foi bem esse o motivo. A razão que levou El Rei D. Joao II a “perdoar” os vis atos do Padre foi mais sui generis.

Francisco Costa, Abade de Trancoso, foi perdoado e mandado em liberdade aos dezassete dias do mês de março de 1487, com o fundamento de, vejam só, ajudar a povoar esta região da Beira Alta, tão despovoada no tempo. Este infame homem saiu em liberdade e tornou-se numa espécie de herói local, é só visitar Trancoso e contar-vos-ão esta história.

Se ele voltou às rezas ou se estes são factos reais, isso não sei, mas tenho para mim que, a ser real esta história, a contagem de filhos feitos em tudo o que mexia não se ficou pelos 275 ou 299!