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A serra pelo Olhar do Manuel

“Boa tarde Manuel! Continuamos muito interessados em fazer um artigo acerca do teu trabalho! Fico a aguardar!”. “Olá. Obrigado. Já comecei, mas nem sempre tenho paciência para escrever, sou mais de imagens…”.

Quando, em junho, vagueava pelo facebook num daqueles passeios comuns, que na maioria das vezes nos leva a lugar algum, encontrei uma fotografia, partilhada por alguém, já não me lembro quem. A fotografia prendeu-me o olhar, não apenas pelo que retratava (uma paisagem da Serra da Estrela), mas como a retratava. Ia para além da simples captação de uma paisagem. A luz, o enquadramento, mas principalmente, o que me fazia sentir, foi inspirador. Virei o ecrã e mostrei à minha colega que, tal como eu, ficou uns segundos a olhar para aquela imagem e deixou sair um “uau”.

Procurei mais trabalhos do Manuel Ferreira, até que encontrei a página do facebook dele, com um leque de imagens semelhantes àquela que me tinha levado ali.

Todas elas me contavam uma história diferente.

Todas elas me davam vontade de as escrever.

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Não foi difícil chegar à conversa com o Manuel Ferreira que, prontamente, nos cedeu algumas fotografias para ilustrarmos a região de Folgosinho, aldeia que lhe é muito querida também. Mas nós queríamos mais que fotografias, queríamos conhecer o olhar que as captou. Lá conseguimos convencer este homem, que escreve com imagens a confessar-nos, com palavras, qual era o segredo por trás da magia que conseguimos sentir nas suas fotos.

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É um homem de imagens com paixão pela natureza.

Licenciado em Geografia, viu o seu amor pela fotografia crescer aquando da necessidade de fazer alguns registos paisagísticos naturais. Foi nesse contexto que comprou a primeira máquina fotográfica, uma Mustek de 4 Megapixels, companhia nas saídas de campo de algumas cadeiras do curso.

Para realizar a tese de final de curso, onde fez o levantamento fotográfico e georeferenciação, cartografando digitalmente vários percursos pedestres, TT e BTT do concelho de Gouveia, compra uma Konica Minolta (Bridge) e a paixão cimenta os seus alicerces, mas manteve-se tranquila, reacendendo a sua chama quando Manuel se torna o fotografo de serviço da passagem de ano 2012-2013.

É a partir desta altura que a fotografia se assume como parte integrante da sua forma de estar na vida.

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Manuel Ferreira define-se como uma pessoa observadora, atenta ao meio envolvente e a fotografia é a melhor forma de se expressar.

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A Serra da Estrela sempre fez parte da vida deste fotografo e as suas ligações ao meio fazem com que Serra seja um elemento inspirador que tem alimentado e consolidado o seu interesse pela arte de fazer fotografia, e não há uma estação do ano, um dia ou mesmo uma hora que ele considere única para fotografar.

Todas os momentos são especiais na Serra.

“Há sempre algo para descobrir, para explorar, para captar”.

Confessa, no entanto, que o facto de estudar a natureza e a sua relação com a mesma lhe permitiu conhecer as suas dinâmicas, belezas e os seus sinais.

“A luz define e molda a paisagem, por isso a hora dourada, o nascer e o pôr do sol são, para mim, as horas do dia de eleição. O amanhecer, pelos tons ainda frios e a vista privilegiada que temos das Penhas Douradas sobre a meseta ibérica e pôr do sol pelo vasto horizonte (Lousã, Caramulo, Luso) e pelas cores quentes, do ano. Como é óbvio a neve na serra cria um certo êxtase e ânsia de fazer fotografias diferentes de todas as outras serras de Portugal, mas adoro o Outono pelas cores e tons, a primavera pela vida que acorda depois do Inverno e o Verão pelo dinamismo que ganham certas zonas, como praias fluviais. Resumindo, sempre diferente, sempre interessante, sempre motivado por fazer diferente dos outros olhares e mostrar o que esta Serra tem de melhor”.

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Apesar de ser um apaixonado pela Serra e pela fotografia, Manuel não é um daqueles aficionados que anda sempre com o equipamento à mão, não vá surgir o momento perfeito para uma fotografia, utilizando o telemóvel para o que chama de “registos de ocasião”.

Costuma sair com o propósito de fotografar, idealizando um cenário para a fotografia perfeita o que, segundo o mesmo, raramente acontece, acabando por transformar a sua visão numa tela em branco à espera de ser pintada, variando sempre com o estado do clima que, “como sabemos a estas altitudes está em constante mudança”.

Fotografar, para o Manuel, começa por ser um ato racional que rapidamente se transforma numa ação emocional assim que pega na máquina acabando por fazer várias fotografias do mesmo lugar com enquadramentos diferentes e esperando por uma luz ou uma sombra melhores, sendo que não existe um local que lhe seja favorito para fotografar, todos têm uma essência diferente conforme a altura do dia ou do ano.

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A paixão de Manuel pela Serra está visível nas suas fotografais, é algo quase papável, mas neste momento o seu modelo de eleição não é uma paisagem e imana uma luz muito própria que apela ao coração do Manuel como nenhum outro modelo o poderá fazer, o seu filho de dois meses.

Registos diferentes com emoções diferentes.

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Quando vemos uma fotografia do Manuel é inevitável não ficarmos presos a ela, guardando alguns momentos para entrarmos na mesma.

Não é apenas uma paisagem, muito menos uma fotografia bonita.

É o captar de um momento, guardado na perfeição de uma imagem.

Seja pela luz, seja pelo movimento, seja pela carga emotiva que uma paisagem pode despertar em quem a vê. Dá-nos vontade de entrar nesse quadro e lá nos perdermos. Se é isso que o Manuel pretende que sintamos nas suas fotografias? Acredito que sim.

Manuel Ferreira é daquele tipo de fotógrafos que capta com intenção, tentando que fique impressa na imagem a emoção que o fez tirar a fotografia naquele momento, com determinado ângulo, luz ou sombra. Tal como um poeta, mostra em imagem o que um poeta transmite em palavras. Não o faz por fazer nem por mero senso estético.

A Serra tem paisagem belíssimas, não é difícil encontrar um cenário perfeito para uma fotografia bonita, mas difícil é captar o que esse cenário nos faz sentir, e é aí que reside a arte de Manuel.

“Tirar fotografias é fácil, FAZER  fotografia requer algumas técnicas, respeitar algumas regras… cada um é livre de mostrar o seu olhar e de se expressar, mas como num texto, a maior parte das pessoas sabe escrever, mas será que toda a gente escreve bem?! Toda a gente interpreta da mesma maneira?! Não, na fotografia é a mesma situação, temos de fazer com que o público veja aquilo que queremos mostrar numa imagem só e para isso é necessário ter noção do ângulo fotográfico, da profundidade de campo e das demais variantes fotográficas, para que todos que a vejam, percebam o enquadramento e mais facilmente a interiorizem e apreciem”.

Mas mais que técnica é preciso ter emoção e é isso que captamos nos trabalhos deste fotografo.

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Há vários locais que Manuel Ferreira aconselha para captar boas fotografias como o Covão Dametade, Penhas Douradas, Bosque de São Lourenço, Vale Glaciar de Manteigas ou o Polo do Inferno. Apenas alguns dos locais desta vasta Serra.

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São fotografias que fascinam não apenas quem aqui vive.

Os seus trabalhos não nos fazem achar que é apenas uma fotografia bonita, é uma imagem que nos faz deixar sair um “uau” e isso é, para mim, o mais importante.

 

Tânia Fernandes

Fotografia: Manuel Ferreira

 

 

TT na Serra é inspiração

O ronronar do motor. Damos à chave e o som percorre-nos as veias. Cresce a ansiedade e o corpo antecipa a chegada da adrenalina que em breve o irá invadir. O destino? O melhor do mundo, a paisagem irregular da Serra da Estrela. O veículo?

Só pode ser um Todo-o-terreno! Pé no pedal e lá vamos nós. Na Serra da Estrela o problema está em decidir qual o percurso, a única garantia que temos é que seremos invadidos por uma onda de epinefrinas que nos fará tão felizes!

Partimos pelo asfalto até ao nosso destino. Pelo caminho somos acompanhados pelas paisagens da Serra. É primavera e a montanha enche-se de cor. Abrimos a janela do jipe e deixamo-nos abraçar pelo vento fresco que se junta ao calor do sol numa sinfonia perfeita.

A primavera é das alturas ideais para pegar no jipe, juntar alguns amigos e partir à aventura, descobrindo caminhos e novas paisagens, e a Serra da Estrela consegue surpreender-nos sempre, seja pela fauna ou pela flora, seja pelas pequenas nuances de luz e cor que bailam por entre a vegetação, seja pelo cantar dos cursos de água que serpenteiam a Serra.

Subimos pela montanha, saímos do asfalto e entramos pela serra dentro. Calmamente enfrentamos os socalcos do terreno, não por medo mas porque devagar apreciamos a paisagem com a devida calma. Deixamos o pó atrás de nós a marcar o caminho, passamos por cursos de água e sentimos o salpicar das gotas no rosto.

Parámos. Saímos do jipe e aproveitamos para sentir o sol percorrer-nos o corpo, aquecendo a alma e enchendo-nos de energia.

Ao longe uma águia voa, e com sorte poderemos ver uma ou outra raposa. Sacamos da máquina fotográfica e fazemos uns cliques, tentamos captar os momentos, prender a paisagem para mais tarde relembrarmos este dia.

Entramos novamente no jipe, apertamos os cintos e continuamos a nossa viagem. Subimos o mais alto que podemos, hoje queremos estar perto do céu e na Serra da Estrela há vários locais onde podemos ter essa sensação quase vertiginosa de estar no topo do mundo, e que mundo maravilhoso é. À nossa volta a paz dos dias da Serra, o silêncio ensurdecedor da natureza. Sabemos que temos de voltar, mas a vontade é pouca.

Ao entardecer regressamos, as cores mudam, a luz transfigura-se e somos espetadores privilegiados de um espetáculo capaz de nos fazer parar a respiração e levitar.

Voltamos ao asfalto. A noite já caiu. Pelas bermas da estrada conseguimos vislumbrar pequenos brilhos, são olhos que correm pelos caminhos e se refugiam nos campos envoltos pelo negro da noite. Podemos parar e ouvimos os pios dos pássaros que se preparam para dormir. Ouvimos o concerto das cigarras, e os ruídos dos animais da noite que se juntam ao ronronar do motor.

Desligamos o motor.

Voltaremos em breve.

O TT na Serra é mais que um desporto, mais que um passatempo. Quando experimentamos a certeza é de que se instalará uma ansia constante que só desaparecerá quando voltarmos a entrar no jipe, ligarmos o motor e seguirmos pelo caminho que a serra escolher para nós nesse dia.